O polêmico regime da separação obrigatória de bens e as causas suspensivas que o exigem

Publicado por:

Mellina Galvanin

É largamente conhecido que casamentos (e mesmo uniões estáveis) iniciados quando um dos cônjuges tenha mais de 70 anos exige como regime de bens obrigatório a separação de bens.

No entanto, nos termos do artigo 1.641 do Código Civil, existem outros motivos que obrigam que o regime de bens adotado seja obrigatoriamente o da separação total, ainda que sem a escolha voluntária pelo casal.

Dentre estes motivos, estão, principalmente, os listados no artigo 1.523 do Código Civil.

É o caso, por exemplo, do viúvo ou da viúva, que, possuindo filhos advindos do casamento com o cônjuge falecido, resolve casar-se novamente antes de concluídos o inventário e a partilha de bens do referido cônjuge falecido.

Outra hipótese que também exige a separação de bens é a do divorciado que ainda não decidiu a partilha dos bens do casamento anterior, mas, ainda assim, inicia outro casamento ou união estável.

Como se pode observar, tais causas suspensivas[1] previstas pela legislação civil são temporárias. Nos exemplos acima, bastaria a conclusão da partilha dos bens do falecido ou do casal divorciado para que a causa suspensiva deixasse de existir.

Mas o que acontece nesses casos? O regime da separação permanece, já que quando do casamento ou início da união estável este regime foi obrigatoriamente adotado, ou o regime se modifica?

Ha pouquíssima discussão a este respeito.

Porém o que nos parece mais coerente, igualitário e justo é que deixando de existir as condições que obrigavam o regime da separação total de bens, tal regime seja automaticamente alterado para o regime padrão, que é o regime da comunhão parcial de bens. Isto se os cônjuges não escolheram um regime subsidiário, claro.

Por exemplo: para o caso do viúvo ou da viúva que, possuindo filhos em conjunto com o cônjuge falecido, casou-se antes de concluídos o inventário e a partilha dos bens do casal, após concluídos tais procedimentos, tornam-se inexistentes os motivos que justificariam a separação obrigatória de bens, levando-se à alteração automática do regime.

É de se reconhecer que a mudança do regime da separação obrigatória de bens para o regime padrão ou outro que seja da livre escolha dos cônjuges é garantia de que este protecionismo/intervencionismo do Estado na esfera de assuntos que são exclusivamente da vontade das partes ocorra na medida do mínimo possível.

Válido notar que para que se pudesse manter o regime da separação de bens (agora não mais a obrigatória, mas sim a convencional) seria necessário um pacto antenupcial, o que não se exige para a separação obrigatória de bens. Se os nubentes não o fizeram, entendemos que não há como o regime de bens continuar como separação, passando ao da comunhão parcial de bens.

Essa discussão parece extremamente teórica, porém é inegável o grande impacto dos regimes em uma separação ou sucessão, uma vez que, a depender do regime de bens, os cônjuges passam a ter direito a participação no patrimônio do outro cônjuge, inclusive concorrendo com descendentes em determinadas situações.

Por isso, quando se trata de direito de família, é extremamente necessário se atentar para os menores detalhes previstos em lei, pois estes detalhes farão enorme diferença no futuro.


[1] As demais causas suspensivas previstas no artigo 1.523 do Código Civil são:

(i) a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;

(ii) o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas.

(Foto por Zoriana Stakhniv em Unsplash)

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